Por: Nonato Fontes em 09/2014 - Visitas: 8820
Conta-se que numa fazenda de nome Goianazes, no interior de Goiás, havia um senhor muito bom de gado, o Vaqueiro Ananias. Desses que não existia nada que lhe pregasse medo. Era o Vaqueiro de confiança da fazenda, seu Ananias como era tratado pelos companheiros, não pela idade, mas seu jeito firme e corajoso impunha respeito.
Apesar do tratamento dos amigos, Seu Ananias não arrotava vantagens, era apenas muito dedicado ao trabalho, onde poderiam lhe entregar ouro em pó, sua honestidade era um dos pontos fortes de seu caráter. O patrão, fazendeiro muito rico na região, andava todo pabo com o trabalhador que tinha, dizia ele:
Foi cria minha, nasceu na minha fazenda e por lá ficou, homem da mais alta qualidade, ser mais humano que ele não existe.
Ananias tinha nascido na Fazenda Goianazes, seu pai havia sido o vaqueiro dali onde hoje Ananias comanda a vacaria de mais de duas mil cabeças de gado. Contava com cinco ajudantes, era ele quem comandava a dianteira no tratamento dos bois. Todo dia estava ali, pronto para o que necessitasse, levava e trazia o gado seja para as exposições ou feiras de gado como também para a pastagem.
Certa feita, Ananias não apareceu como de costume, todos os dias às quatro horas da manhã. Preocupado, o patrão foi até sua casa, era próxima, morava onde viveu com seus pais numa casa da fazenda perto da casa grande. Quando chegou, notou que sua esposa chorava encostada no alpendre, perguntou sobre o Vaqueiro, essa lhe respondeu que estava morrendo lá dentro, febre amarela. Seu patrão nem entrou, chamou logo um de seus motoristas e mandou que esse trouxesse um médico o mais rápido possível. Sem demora chegou socorro. O médico entrou no quarto onde estava Ananias, demoraram uns cinco minutos e retornou com a triste notícia que seu Vaqueiro acabava de morrer.
A noite do velório contou com muitos amigos, até fazendeiros da redondeza que gostavam do Ananias compareceram. Uma coisa chamou muito a atenção dos presentes, seu cavalo havia morrido cinco minutos antes do seu dono. Outra sem explicação nessa noite era o gado que não parava de berrar, berros tristes, permanecendo calmos, parados, como se em respeito ao Vaqueiro Ananias.
A vida na fazenda não continuou com a alegria que era antes, o patrão perdeu o gosto pela criação, também havia coisas impossíveis de se explicar depois da morte do vaqueiro Ananias, o gado não era aquele gado manso como antes, passou a desgarrar quase todos os dias. Vaqueiros novos eram contratados, mas nenhum conseguia conduzir o gado sem que lhe custasse muito trabalho, isso deixou o patrão sem o gosto pela fazenda. Demoraram uns dois meses nessa labuta, até que um dia o patrão chamou a esposa e combinou a venda da fazenda, com uma condição: Uma parte do gado e das terras iria ficar com a família do Ananias, pois lhe devia muito mais que isso, dizia ele.
A noite que sucedeu a conversa, o fazendeiro não conseguia dormir, rolava na cama de um lado para o outro, quando de repente, ouve barulhos de patas de cavalo a cavalgar no terreiro. De súbito se levanta e sai para ver o que estava acontecendo, lá já estavam dois dos vaqueiros tentando pegar no cabresto de um Cavalo Preto. Ninguém conseguia chegar até ele, quando se aproximava, ele afastava, quando o fazendeiro encosta, o cavalo vai a sua direção, dois dos homens tentaram agarrá-lo, mas o patrão pediu que o deixasse. O cavalo balançava a cabeça em movimentos circulares e ia fazendo voltas ao redor do fazendeiro, esse nem se mexia, depois de umas cinco voltas, saiu em disparada rumo à mata preservada que a fazenda exibia logo a frente da casa. Ainda ficaram a perguntar um ao outro de onde apareceu aquele animal? Porém o fazendeiro pediu que fossem dormir, na certa tivesse escapado de alguma fazenda próxima.
No outro dia logo cedo, quatro horas como de costume, o cavalo apareceu, ficando na lateral do curral, o gado parecia tranquilo neste dia. Chegaram os vaqueiros que admiraram a presença do animal mais uma vez por ali, mas continuaram o serviço. Preocupados, abriram a porteira achando que o gado ia dar aquele mesmo trabalho, enganaram-se, o gado ia tranquilo a passos quase combinados, à frente o Cavalo Preto seguia, como se chamando a boiada. Os vaqueiros ficaram encabulados, jamais tinham visto aquilo em suas vidas, assim seguiu o gado, do curral para o pasto e do pasto para o curral, sempre com aquele Cavalo Preto comandando a frente da boiada.
Quando a noite chega, já em preparo para dormir, o fazendeiro volta a ouvir sons de cavalgada no terreiro, saindo fora acompanhado da esposa percebe que o Cavalo Preto se encontrava a beira do curral, sem entender o porquê da atitude do animal, resolve chama-lo com sons de vaqueiro quando monta em seu cavalo. O cavalo não se aproxima, de longe balança a cabeça em movimentos para trás, como se chamasse o fazendeiro, esse entende e saiu em sua direção. Chegando próximo o cavalo o direciona para mais perto da mata, se distanciando do alpendre da casa. Depois param, demoram um pouco frente a frente. Admirada sua esposa observa, nada enxerga, apenas vultos. Depois de um bom tempo o cavalo sai em disparada pela mata, o fazendeiro volta para casa com a cara de espanto, chama a esposa para dentro e senta numa cadeira de couro frente uma lareira, olha para a mulher, essa apenas admira, sem dizer nada. Demora um pouco contemplativo, olhando o rosto da mulher e pergunta:
Você confia em mim?
Sim! Responde a mulher.
Acredita no que eu disser?
Sim! O quê está acontecendo?
É o Ananias! Disse ele.
O que você está dizendo? Indaga a mulher admirada.
O cavalo! Eu vi, estava montado nele! O Ananias apareceu quando nos afastamos do curral, era o Ananias. Acredita em mim?
Sim! Respondeu atônita a mulher.
Pediu-me que não vendesse a fazenda, ele estaria aqui comigo sempre, enquanto eu vivesse ele estaria a acompanhar os animais e a vigiar a fazenda todas as horas, nada de ruim ia acontecer, dizia ele. Pediu que apenas continuasse cuidando da sua família, como sempre cuidei, era tudo que me pedia em troca, sabia que eu não iria lhe faltar. Prometeu cuidar da fazenda para sempre, até o tempo em que eu vivesse.
Mas o que você está falando? Eu não vi nada.
Você tem de acreditar em mim!
Outra coisa que ele me pediu foi para não comentar com ninguém, nem mesmo com a sua família, apenas com você que é minha esposa, pois o amanhã ninguém sabe, e se um dia eu for primeiro ele continuará a vigiar e cuidar dos animais. Você tem que manter esse segredo, é necessário, foi o que ele falou sobre isso. Não se assuste ele veio nos ajudar, O Vaqueiro Ananias está aqui.
Os dias se passaram na fazenda como na época de Ananias, era festas a beira da fogueira, conversas com a peonada, sempre com o Cavalo Preto de Ananias ali do lado, olhando. A desculpa que o fazendeiro encontrou foi que era um animal que apareceu e não tinha dono, iria cuidar dele, pois ajudava na condução do gado como se estivesse com algum vaqueiro bom ali com ele. Um dos peões ainda completou, como se o Ananias estive em nosso meio. Verdade! Concordou a vaqueirama presente. O fazendeiro pediu silêncio, todos pararam, ele disse em tom de comemoração: Depois que este cavalo apareceu, nosso trabalho ficou prazeroso, a fazenda Goianazes agora tem um vaqueiro invisível, que todos nós comparamos a Ananias. Então, a partir de hoje, o nome da fazenda passa a ser, Fazenda Vaqueiro Ananias.
Quem por ventura passar pelo interior de Goiás e encontrar a fazenda Vaqueiro Ananias, deve parar e colocar uma mão em uma das estacas que forma o cercado da fazenda, e dizer cinco vezes,
Ananias bom vaqueiro,
Que boiada aqui o traz?
Se já cumpristes o teu destino,
Sem poder voltar atrás,
Deixo aqui o meu pedido,
Ananias descanse em paz.
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