Por: Vilebaldo Rocha em 07/2014 - Visitas: 2705
Deolinda
São poucos os nomes femininos na história da poesia brasileira. Isto se deve, talvez, ao fato de que até bem pouco tempo atrás as mulheres tinham seus direitos cerceados. Não podiam pensar nem viver. Mas, as que o fizeram, foi com maestria inigualável, diga-se de passagem Cora Coralina, Francisca Júlia e a maior de todas: Cecília Meireles.
No concurso realizado pela U.P.E., modalidade poesia, categoria adulto, DEOLINDA MARIA DE SOUSA MARQUES, residente em Bocaina-PI e professora da Escola Normal de Picos, arrebatou, simplesmente, o segundo e o terceiro lugar. Seu verso é como a água correndo no leito do rio, calmo e tranquilo, mas visceral e implacável, carregado de ternura.
O poema classificado em segundo lugar foi:
AI LAVOISIER
Ai cheiro de bambural, de flores de pereiro,
de pau-d'arco, de cipó amarelo.
Ai brinquinhos de cansanção, de crista de galo,
esmalte de palmatória, óculos de fedegoso.
Fedegoso da colheita de grãos, da fartura da infância.
Ai vaquinhas de cera, de osso;
cavalos-de-pau, de tala de carnaúba.
Ai casinhas com paredes de terra
enfeitadas com flores de salsa,
de crista-de-galo, de cipó amarelo.
Ai céu estrelado, busca do Cruzeiro do Sul,
das três Marias, do Sete-estrelas, do Caminho de Santiago.
Se para Lavoisier, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma,
para as crianças, tudo se transforma pela imaginação
num mundo de sonhos e fantasias.
O cheiro, hoje, é do Boticário
(a Avon saiu da moda).
As matas estão devastadas.
A estrela fabrica tudo.
As flores são de plástico
( e custam um e noventa e nove).
A luz elétrica engoliu o céu.
Ai Estrela D'Alva da minha infância
e da Manhã de Manuel Bandeira.
A Indústria exterminou a infância!
Um poeta se faz com versos e estes da poetisa Deolinda têm a marca do artista que não foge do seu compromisso. Esta é uma estrela de primeira grandeza, com sensibilidade aguçada e versos certeiros. Poeta consciente dos problemas da sua gente, acordando no povo o sentido da luta pela terra e pela vida. Mas principalmente em prol da boa poesia.
O poema classificado em terceiro lugar foi:
A TERRA
Há terra.
Quem quer terra
ara a terra
cava a terra
ama a terra.
Com a mão
semeia grão
no coração
da terra.
Quem tem terra
é quem enterra
é quem emperra
a seme-ação.
Só
na terra
a vida
en-
cer-
ra.
Deolinda. Gravem este nome! Ele veio para ficar cravado na história da poesia de nossa terra. Fica aqui nossa torcida pela publicação, o mais rápido possível, de seu primeiro livro. Sabemos o quão é difícil, mas não impossível.