Por: Nonato Fontes em 09/2014 - Visitas: 2790
Anselmo era um senhor de uns 71 anos viúvo e solitário que morava na Lapa, seus filhos, seis no total, eram todos casados e viviam em terras distantes, apenas um morava no Brasil, esse quando casou foi morar no amazonas e, como os outros, há anos não visitava o pai. Vivia assim seu Anselmo, como era conhecido na redondeza, sozinho e sem visitas, apenas seus vizinhos, mas a família sempre distante.
A vida guarda seus segredos, suas surpresas, foi o que presenciou a gente da vizinhança vendo as entradas repetidas de uma senhorita, pouco sociável para eles, a casa de seu Anselmo.
Era uma mulher de estatura baixa, cabelos lisos, um pouco gorda e vestindo roupas curtas, aparentava ter uns 34 anos de idade. Dia sim dia não estava lá a visitá-lo, chegava por volta das 14hs e saia às 18hs, visita demorada e estranha, comentavam os vizinhos. Um dia uma senhora que morava ao lado resolveu perguntar ao seu Anselmo sobre a moça, esse lhe respondera que era uma parenta que viera do interior do Pernambuco, a explicação satisfez a curiosa vizinha.
O tempo ia se passando e seu Anselmo vivia mais feliz, sua solidão era amenizada nos braços da companheira. Margarida era uma jovem dessas que nada tinha de bens, mas dotada das artimanhas de mulher que sem pudor arrasta os homens para seu delírio. Morava num bordel situado na zona norte da cidade, viera do estado do Pernambuco para morar no Rio, guardava segredo de estado quando alguém lhe perguntava quem era a família, logo desviava o assunto para outro rumo, se insistiam ela só respondia que era cigana, que vivia como eles, sem destino certo, sem família, uma hora to aqui! Outra hora acolá! E soltava uma gargalhada colocando para fora todos os seus dentes estragados.
Assim seu Anselmo o conhecera e assim foi se apaixonando, se entregando as mãos do amor e suas unhas afiadas. Com o passar dos dias as visitas de Margarida a sua casa foram diminuindo, agora era uma vez na semana, por vezes nem aparecia, mas seu Anselmo ia até o recinto onde sua Amada vivia e ganhava o sustento, lá chegando era contentado com os carinhos comprados e com as artimanhas que lhe eram peculiares, fingindo o grande amor nos braços de seu príncipe. Depois de pagar a comissão da patroa tomava o rumo de casa sozinho, mas feliz.
Vida noves foras nada!
Seu Anselmo tratava sua Margarida com todo o carinho do mundo, pagou o tratamento de um sinal que já tomava metade do seu queixo, comprava roupas, jóias, tudo que ela pedia, só não conseguiu comprar seu coração, e justamente ele que ela dizia ser a sua casa, porém o coração de Margarida não era casa de ninguém, nem mesmo dela, a vida o fizera assim.
O tempo ia passando como um relógio falho, um dia seu Anselmo dormia feliz, outro triste, agora sua Margarida costumava sumir até do Bordel onde trabalhava, à sua casa ela não ia mais, somente quando ele a procurava era que encontrava consolo, nas vezes que a encontrava. E assim foi se passando as horas, os dias, o vizinho que outrora era solitário, agora passou a ser triste também, seus amigos estranharam aquela mudança, mas não queriam incomodar. Numa certa noite, quando não a encontrou no recinto, seu Anselmo resolve ir atrás de Margarida um pouco mais longe, e depois de um longo caminho percorrido a encontra num barzinho bebendo com alguns homens, uns sóbrios, outros bêbados, um deles estava a abraçá-la, acariciando seus cabelos, pouco resta às pernas de seu Anselmo, o ciúme reduziu aquele homem a um farrapo, quando o avista, Margarida tem uma crise de raiva e sai em sua direção com palavrões, o pobre homem pouco compreende, volta para casa sem sua Margarida.
Vida noves fora nada!
Em casa o relógio parece parar, as horas passam lentas, as paredes mudam de cores, se banham de vermelho e nascem flores, as telhas são canivetes que ameaçam despencar, a cama se movimenta em direção a rua e as paredes agora choram e o chamam de Pai, seu Anselmo grita, porém seu grito não consegue se quer ultrapassar a porta, Levanta meio tonto, pega uma faca e sai na rua sem direção, as pobres pernas que guiavam todas as noites ao bordel o levam mais uma vez, última vez! Margarida havia voltado da farra e se encontrava em uma banca conversando com dois senhores, chegando ao recinto, seu Anselmo saca sua faca e enfia coração adentro de sua Margarida, dois corpos desabam no chão da vida, no chão da morte! Chamaram a polícia, seu Anselmo é conduzido para a prisão, nenhuma palavra, seus olhos parecem não piscar. Jogam-no na cela como um pacote vazio, que ao cair no chão se deita, assim o fizeram com aquele homem. Passaram-se os dias, e nem se alimentar queria, seu corpo já estava cansado, não era mais só da idade. Quando a notícia chega aos ouvidos do filho, esse vai à procura do pai, quando o avista na cela deitado tenta acordá-lo, porém seu velho pai já não existia, recebera o corpo sem vida daquele homem que outrora o carregou nos braços, COM OS OLHOS CHEIOS DE VIDA!
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